Já imaginou conhecer a pessoa dos seus sonhos, nutrir uma relação virtual por meses e, ao final, sair disso com trauma psicológico e prejuízo financeiro estrondoso (que pode chegar a quase r$ 1 milhão)? é o que acontece com as vítimas do “golpe do amor” no Tinder.
Tudo começa quando o golpista se passa pelo homem perfeito, ilude as vítimas e começa a extorqui-las com histórias mentirosas.
com boletins de ocorrência que muitas vezes não dão em nada e vítimas que preferem não levar os casos à polícia, por medo e muitas vezes vergonha, com isso pessoas comuns começaram a investigar, por conta própria, esses golpistas.
São as investigadoras e os investigadores de esquemas e fraudes que usam a internet para seguir o rastro deixado pelas quadrilhas especializadas em crimes cibernéticos.
Uma dessas investigadoras é Glauce lima, que investiga apenas os Scammers do amor. eles roubam fotos e vídeos de uma pessoa – geralmente americanos ou canadenses –, montam um perfil em sites de relacionamento ou no instagram, abordam mulheres, iniciam uma relação à distância e passam a pedir dinheiro para as mais diversas situações.
Segundo Glauce, 90% desses perfis são montados por nigerianos. a chamada “máfia nigeriana” atua no mundo inteiro, com a ajuda de pessoas, os “laranjas” nos países onde realizam os golpes. são esses que abrem e movimentam as contas bancárias para as quais as vítimas fazem as transferências.
Glauce tem contato com vários policiais e militares do Brasil e dos estados unidos e já desmascarou um monte de golpistas e possui hoje um instituto para ajudar vítimas desses esquemas com advogados e psicólogos gratuitamente.
Como tudo começou
Em 2011, uma amiga dela, alemã, foi vítima de um golpe: era a primeira vez que a Glauce tinha contado com o golpe do amor. Para arrancar dinheiro da vítima, o golpista (que dizia ser um engenheiro americano trabalhando em uma obra milionária) inventava histórias cada vez mais absurdas:
Na primeira vez que, O HOMEM pediu um “empréstimo” a ela, disse que iria receber máquinas, mas o cartão estava com problema. E, se não pagasse naquele dia, iria perder não só as escavadeiras, mas também a obra. Ela mandou.
Depois, disse que o filho ficou doente e ele precisava de dinheiro emprestado para pagar o hospital. Dessa vez, ela também mandou.
Um mês depois, ele precisou fazer uma cirurgia de estômago. Ela, de novo, mandou.
Depois, disse que estava trabalhando em uma plataforma de petróleo, seu barco tinha sido invadido por piratas que queriam matar ele e sua única saída era, mais uma vez, recorrer a ela. Mais uma remessa enviada.
“São absurdos assim. Mas, infelizmente, a pessoa acaba se apaixonando e acaba caindo”, conta Glauce.
Apartir dessa história, ela começou a pesquisar sobre esse tipo de golpe. “Eu comecei a fuçar em grupos, Google, fazer pesquisas, né? E encontrei alguns grupos americanos. Eu entrei nesses grupos e lá eles tinham material muito grande sobre os golpes. Fiquei nesses grupos um bom tempo e, por meio deles, descobri alguns scammers e alguns grupos desses scammers”, conta.
INFILTRADA NO ESQUEMA
“Aí eu montei esse perfil de um nigeriano e entrei nesses grupos para saber como eles trabalhavam, ver a dinâmica de quem era quem. Eu adicionava aquelas pessoas que eu sabia que realmente eram scammers, acabava ficando no círculo e amizade deles e sabendo tudo que eles postavam sobre os golpes”, narra.
Depois de ter montado todo o esquema dos golpistas, foi a vez de passar para o outro lado. Ela criou um perfil falso no mesmo aplicativo de relacionamento que a amiga alemã tinha feito. Em questão de poucas horas, ela foi abordada por um suposto soldado americano com o mesmo perfil que os scammers costumavam usar.
Ela ‘deu corda’ e pedia sempre fotos e vídeos. Munida desse material, encontrou o perfil do pai do soldado da foto, contou a história a ele e pediu que ele a pusesse em contato com o filho. Em um ano, ela derrubou mais de 1,6 mil perfis falsos desse soldado no Facebook.
ARMADILHA
Gleice passou anos monitorando as atividades dos golpistas e estava em três grupos diferentes onde as quadrilhas se organizavam. Então, ela sugeriu que a amiga continuasse falando com o golpista, mesmo depois da perda financeira e do abalo emocional, para tentar rastreá-lo.
“Minha amiga já tinha confrontado que a foto que ele estava usando, aquele nome a localidade onde ele dizia que estava não eram reais, porque nós localizamos a pessoa verdadeira. Então, ele acabou se revelando pra ela, falou que era nigeriano, mandou fotos dele e estava até fazendo chamada de vídeo, ensinando ela falar inglês.”
Ele estava muito confiante na paixão dela e no romance dos dois. Para manter a conversa e ganhar mais ainda a confiança dele, a alemã continuava mandando algumas das coisas que ele pedia.
A PRISÃO
A essa altura, elas já tinham várias informações sobre ele: Nome, idade, cidade onde morava e até o endereço da agência de correio onde ele retirava as ‘encomendas’.
Glauce mandava de 30 a 40 e-mails por dia para polícia da Nigéria, com um verdadeiro dossiê do golpista, mas era ignorada. Então, ela resolveu apostar tudo.
“No meio de 2017, fui pra Alemanha, montei o processo e mandei pra eles. Eles me responderam no mesmo dia e, na semana seguinte, nós conseguimos prender o rapaz”, conta.
A polícia nigeriana pediu a ela para montar um pacote com mimos, como se fosse enviar para ele. Mas orientou que ela enviasse a uma agência específica e avisasse o golpista quando a encomenda chegasse. A polícia rastreou o pacote e monitorou a agência. Quando ele foi retirar, ACABOU SENDO preso na hora.
Apesar da prisão, a vítima não conseguiu reaver o dinheiro perdido.
No Brasil, a vítima que perdeu mais dinheiro entre as que me procuraram Glauce foi lesada em R$ 890 mil.
Muitas pessoas Procuram o Instituto as mulheres são a maioria e geralmente a procuram quando o estrago já foi feito.
Entre as histórias para enganar a vítimas, os golpistas alegam:
* Ser militar, está em missão de paz e precisa de dinheiro pra se manter;
* Ser empresário, fechou um negócio incrível, mas precisa de uma quantia emprestada;
* Ser médico e está em uma missão num país remoto;
* Ser engenheiro e está trabalhando em uma plataforma de petróleo;
* Achou um tesouro e vai mandar para a pessoa, mas precisa que ela pague uma taxa de alfândega;
* Vai enviar um presente para a pessoa, e também precisa da taxa da alfândega.
Também existe o “golpe da novinha”, que acontece, geralmente, com homens. De acordo com o delegado Alessandro Barreto, os golpistas, também por aplicativo ou Instagram, costumam pedir fotos íntimas. E, depois, ameaçam as vítimas. Eles também podem pedir dinheiro e presentes.
Como agir?
Se você está conversando com alguém que conheceu em aplicativo, Facebook ou Instagram e tenha um comportamento como o que foi narrado aqui, busque a polícia e faça um boletim de ocorrência. “Isso ajuda a mostrar que tem algo errado e para onde eles precisam olhar”, diz Glauce.
Em dezembro de 2020, reportagem do Fantástico mostrou um grupo de fraudadores da Nigéria que chegou a faturar R$ 250 milhões com golpes.
Em São Paulo, mais de 100 suspeitos ligados a essa rede internacional de golpistas foram presos naquele mês. Os golpes são aplicados sempre de forma virtual; não existe o contato físico com o criminoso. É tudo fake: a quadrilha cria um personagem com uma história completa, com fotos de eventos em família, viagens, trabalho, passaporte, endereço. O único objetivo de tudo isso é atrair e conquistar a vitima de uma tal forma que ela faça qualquer coisa para manter um relacionamento amoroso.
G1