A mulher que recebeu pedidos de “nudes” e de “teste do sofá” após se candidatar a uma vaga de emprego em uma loja de um shopping no Rio de Janeiro diz que ficou abalada com as mensagens e precisou de ajuda para denunciar o caso na polícia e na Justiça.
Tatiane de Souza processou o shopping, uma loja e o responsável pelo envio da mensagem, que foram condenados a pagar indenização de R$ 50 mil. Os réus ainda podem recorrer da decisão da 7ª Vara Cível do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro.
O shopping diz que condena a atitude (veja detalhes abaixo). O g1 entrou em contato com a defesa do autor das mensagens e da loja. Segundo a advogada Patrícia Monteiro, que responde por ambos, “a empresa repudia qualquer forma de assédio ou condita de importunação sexual contra as mulheres” e adota “protocolos preventivos”.
Ainda de acordo com a defesa, “todas as mulheres que se candidatam são entrevistadas exclusivamente pela gerente”.
A advogada também aponta “disparidade dos horários de uma mesma mensagem, sugerindo adulteração do diálogo” e disse que o celular do réu foi apresentado para perícia, mas o procedimento foi dispensado em juízo.
Denúncia
Mensagem pelo WhatsApp durante entrevista de emprego que foi salva no celular da candidata — Foto: Arquivo pessoal — Foto: Arquivo pessoal
O caso ocorreu em 2019. Tatiane tinha 19 anos e estava em busca de um emprego fixo. Após uma indicação de uma amiga, que já trabalhava no Shopping Metropolitano Barra, na Zona Oeste do Rio, ela fez o cadastro no site do próprio centro de compras na seção “Trabalhe Conosco” para vagas de vendedora.
Ela também entrou em contato nos números de WhatsApp disponíveis, e recebeu mensagens de um homem que falava em nome do centro comercial.
“Foi muito rápido o retorno. Ele já começou a fazer a entrevista comigo, pediu o nome, o endereço, a minha experiência, foi uma entrevista normal no começo”.
A candidata lembra que o homem chegou a marcar a entrevista. “Ele falou o nome da moça que iria me atender e em seguida já mudou o assunto”.
Depois de agendar entrevista para o cargo, ela recebeu mais uma mensagem.
“Não estava nem esperando, ele me pegou muito de surpresa. Estava conversando comigo, marcando a entrevista e do nada já pediu um nude e apagou. Foi muito rápido e de surpresa.”
Segundo a candidata, as mensagens foram apagadas em seguida. No entanto, ela conseguiu salvar as imagens da conversa no celular. De acordo com o advogado Marcus Malcher, as imagens também fazem parte do processo.
“Queria trabalhar em uma vaga em shopping, me cadastrei como vendedora. Era uma coisa nova pra mim, meu sonho. Fiquei muito abalada depois disso, estava precisando do emprego”, disse Tatiane.
Conversas no WhatsApp gravada no celular da candidata — Foto: Arquivo pessoal
Tatiane conta que foi a primeira vez que passou pela situação. “Foi muito constrangedora. Tive uma pessoa do meu lado que me ajudou a ser forte neste momento, que foi meu namorado. Eu sozinha acho que não iria conseguir”.
Inicialmente, ela disse que ligou para a polícia e depois registrou um boletim de ocorrência. “Não sei nem de onde eu tirei força para buscar meus direitos. Isso mexe muito comigo”.
O caso na polícia foi registrado em maio de 2019, na Delegacia de Atendimento à Mulher (Deam) de Jacarepaguá como assédio sexual contra o autor da mensagem. O procedimento foi concluído e encaminhado ao Juizado Especial Criminal (Jecrim). O órgão informou que o processo envolvendo assédio sexual tramita em segredo de Justiça e não deu mais detalhes.
Em paralelo, Tatiane prestava serviços pontuais em um escritório de advocacia e, ao contar sobre o episódio, recebeu orientações para entrar com uma ação pedindo a indenização.
“Em algum momento essa demora da Justiça que foram quatro anos leva a uma descrença. Mas não pode passar impune uma situação desta. Essa indenização acaba tendo esse caráter também não só de reparar, mas de punição também”, explica o advogado Marcus Vinicius Malcher.
Na decisão da Justiça consta que o caso “extrapolou a esfera do simples aborrecimento”, além de “ocasionar grande constrangimento e situação aflitiva à autora”. O valor estabelecido foi determinado por dano moral após ofensa e por caráter educativo.
“Se alguém passar por uma situação desta, procure seus direitos e não pense que não vai dar em nada, não pense que vai ficar impune. Uma hora a pessoa vai ter que pagar pelo que ela fez”, completa Tatiane.
G1